Numa noite ventosa de insónia, um homem decide atravessar as estradas do tédio que o levam com destino certo a lugar nenhum.
Vestiu as calças de ganga clara, já violada pelos programas errados da máquina de lavar roupa enferrujada e moldou no calor do tronco suado, uma t-shirt que também lhe serviu de pijama.
Foge alegremente de papéis esvoaçantes, também eles vagabundos e testemunhas desse breu iluminado por acasos.
O mais solitário dos papéis decidiu colar-se ao peito daquela alma. O homem, surpreendido por tal coragem, examinou a quadrícula. Podia simplesmente tê-la amachucado.
Nela leu um sussurro desesperado, feito em cima de um joelho ou num sítio com pouca luz que dizia: – se ligares este número sabes de onde vens e para onde vais.
Tomado por palpitações, examina a retaguarda por cima dos dois ombros e leva a mão ao bolso onde encontra uma moeda.
Girou sobre 180º graus de uma realidade sonâmbula onde descobriu uma cabine com o telefone caído a umas dezenas de metros. Pegou e colou-o ao ouvido sendo subitamente arrepiado por uma voz rouca e saudosa que lhe pediu solenemente que voltasse para casa.
Susteve a respiração. Encaixou o telefone e relacionou o ter chocado de frente com um papel, com um número, que o levou a ouvir uma voz estranhamente familiar.
Decide ligar. Eis que do outro lado da linha se ouve:
– Filho, sou eu outra vez. Volta para casa. Por favor…